Nota (desnecessária) sobre os “debates”

Marcelo Guimarães Lima.

Sobre os recentes debates tenho lido variadas apreciações, sobretudo no campo progressista que revelam alguma frustração com a performance “comedida” de Lula frente ao Inominável líder (por quanto tempo ainda?) da extrema direita brasileira. Quer me parecer que a maioria destas avaliações assumem como dado aquilo que é no meu entender o essencial da questão: o próprio debate na sua forma e conteúdo. 

A rede de televisão e suas associadas que promoveram o último debate dos candidatos a presidente (17/10) se congratulam repetidamente do (seu) triunfo da “democracia” brasileira. Qual democracia? A pergunta seria talvez interessante ou talvez seria uma pergunta simplória, ingênua, a ser portanto evitada. 

O escarcéu de jornalistas pavoneando abertamente o narcisismo espetacular do espetáculo midiático serve ao menos para deixar claro que o sujeito efetivo destes debates não é “o processo político, a democracia, a opinião pública”, mas é a mídia monopolizada ela mesma que se substitui àquilo que aparenta simplesmente apresentar tal e qual. 

Na histórica sub-democracia brasileira, o papel essencial da chamada grande mídia, os monopólios familiares da comunicação de massas, é contribuir para naturalizar a pseudo-política, a ilusão geral do poder dito representativo, que o é certamente no que diz respeito à minoria dos donos da nação. Bolsonaro, não custa repetir mais uma vez, é o retrato escarrado, sem firulas e sem retoques, da classe dominante brasileira. O mitômano e seus cúmplices expõem demasiado abertamente a fratura, o apartheid social-racial brasileiro, a violência sem tréguas das relações de classe no Brasil hoje. 

Daí talvez a necessidade de parte da burguesia de “abrandar” a face abjeta da exploração, de retirar o Capitão do Baixo-Clero da presidência para que a espoliação do povo e da nação possa continuar “neo-liberalmente”. A Faria Lima, a ala  “moderna” do agronegócio, os juristas ciosos das suas prerrogativas, entre tantos outros, parecem reconhecer finalmente que os tradicionais representantes da cleptocracia nativa ao unirem-se alegre e afoitamente ao aventureiro neofascista deram um passo maior que as pernas e correm o risco de pôr a perder o regime golpista atual nos desafios da crise brasileira e mundial. 

No atual contexto naturalizar a extrema direita e seu Fuher é naturalizar o regime golpista sob o qual vive e padece a maioria. Este é o papel da mídia, de seus jornalistas amestrados e demais colaboradores face às dificuldades que se apresentam interna e externamente para a continuidade do atual regime  fraturado entre os vários bandos de assaltantes e parasitas do tesouro nacional que competem entre si. 

Em tal cenário, acreditar que o debate poderia dar outros frutos é esperar demasiado, é talvez desconhecer ou menosprezar as imposições do contexto e das estruturas vigentes. As quais, por não serem eternas, procuram adaptar-se aos ventos contraditórios que sopram dentro e fora do país, mudando pra que tudo continue igual.



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Comments

  1. Mudando pra q tudo continue igual …esse é o sentimento. Ótimo texto !!

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