O MTST e Luta Contra o Golpe

Marcelo Guimarães Lima

O MTST nasceu no final dos anos 90 de desdobramentos e convergências das lutas do MST, a organização nacional dos trabalhadores rurais pela reforma agrária, e das iniciativas de movimentos sociais urbanos. Nos espaços físicos e conceituais onde reforma agrária e reforma urbana se imbricam, o MST proveu inicialmente modelos organizacionais e apoio direto e indireto para a organização de trabalhadores marginalizados urbanos em luta pela reforma urbana. 

Reforma agrária e reforma urbana significam a luta pelo acesso à terra e à moradia num país de vasta extensão territorial, de grandes concentrações urbanas, de abundantes recursos naturais e de importante produção industrial. Neste país as estruturas de exclusão social ativa, consciente e permanente, formam um sistema complexo elaboradamente alimentado, cuidado e mantido pela classe dominante brasileira que hoje, como no passado recente, se constitui em poderoso e oneroso obstáculo ao desenvolvimento econômico e social da nação.

Vale lembrar aqui a contribuição fundamental do movimento operário para a derrubada da ditadura militar nos anos 80 e o crescente desenvolvimento dos movimentos sociais nos anos 90 em enfrentamento ao modelo neoliberal implantado a partir da presidência de Collor e "consolidado" pelo ex-intelectual FHC, feito presidente da república com o aval da rede Globo, porta-voz perene e desavergonhada dos interesses da oligarquia e do entreguismo no Brasil. 

A luta contra o neoliberalismo levaria ao centro do poder o PT com a presidência de Lula. Não é possível entender a ascensão de Lula no sistema político nacional, oligárquico e excludente por desígnio e por natureza, sem a contribuição fundamental dos movimentos sociais e operário, algo que o controle ideológico, imposto e autoimposto, da informação e da produção intelectual no país tende a ignorar ativamente.

A aparente "normalização" institucional que um governo de esquerda proporcionava ao país como resultado da alongada "transição democrática" pós ditadura e como resposta ao desastre neoliberal do final do século XX, a conjuntura econômica internacional favorável à economia de exportação, a estratégia política do grupo hegemônico do PT, são elementos originais da trama que nos levou ao estado presente.

A mediação dos conflitos e interesses entre as classes dominantes e as classes populares que marcou a estratégia lulo-petista deu seus frutos na conjuntura e ao mesmo tempo, com o golpe de 2016 e o processo golpista em curso, se revelou incapaz de consolidar os avanços relativos, reais ainda que limitados, e de se contrapor à barbárie como estratégia, meio e meta da oligarquia brasileira.

O processo contraditório de relativa integração das massas à vida econômica do país e de crescente concentração do poder econômico, de restruturação nacional por meio de um incipiente processo civilizatório ao mesmo tempo em que se desenvolvia a adequação à ordem neoliberal mundial comandada pela "potência única", os EUA, de privatização dos domínios simbólicos, de massificação pelo "individualismo" programado, de dessocialização pela ideologia do consumo, pelos meios de comunicação, pela "religiosidade" venal, entre outros elementos, tal processo se concluiu com o golpe de 2016 no qual a balança pendeu finalmente para o lado "mais forte".

Na vanguarda da resistência ao golpe entre os movimentos sociais está hoje o MTST. Expondo a fratura social brasileira concentrada na vida urbana, organizando trabalhadores marginalizados para a ação coletiva, conscientizando pela luta atores e espectadores, isto é,  tanto os militantes quanto a opinião pública para além do controle da mídia hegemônica golpista, ou seja, apesar das contantes, incansáveis, absurdas manipulações desta verdadeira indústria da chantagem e da desinformação programada que é hoje a imprensa no Brasil, o MTST  evidencia a radicalidade da situação brasileira onde a luta "setorial" das populações marginalizadas torna-se imediatamente o índice da totalidade estrutural e sua crise que requer, que nos impõe, queiramos ou não, uma resposta total, radical, isto é, de raiz.

No complexo da presente crise brasileira e sua articulação à crise capitalista mundial, expressa hoje na crise do neoliberalismo, a radicalidade se associa à "paciência histórica", quer dizer, enquanto ação corajosa e inteligente que tanto reconhece seus limites como ousa recriar ativamente seu contexto objetivo e produzir eficácia ali onde os obstáculos se apresentam ou se declaram como "intransponíveis". Aqui, novamente, temos o exemplo dos militantes, estes homens, mulheres, jovens e crianças do MTST nas ocupações onde, em condições precárias de existência cotidiana, a relação ao mundo e a sociabilidade são, em processos complexos, reinventadas por meio da iniciativa rebelde. Iniciativa que refaz os sujeitos os quais, em solidariedade e na defesa de direitos, tomam para si a responsabilidade de transformar suas condições e situações por meio de ações que transcendem objetivamente a "ordem" estabelecida e desafiam o poder oligárquico, a desumanização inscrita nas estruturas sociais e políticas da nação e exacerbadas com o golpe de 2016.

No contexto atual as ações do MTST se contrapõem globalmente, objetivamente ao golpe e seus aliados e beneficiários: os neoliberais, os entreguistas, o (des)"ordenamento jurídico" do país, os golpistas togados, o aparelho repressor do estado, o Partido da Imprensa Golpista, etc. 

Estes homens e mulheres de coragem chamam assim à solidariedade e à resistência todos as forças da nação que se opõem, hoje como no passado, à barbárie institucionalizada.

As fotos que seguem documentam a ocupação em curso em São Bernardo do Campo em finais de dezembro de 2017. Mostram os rostos e as situações das famílias, homens, mulheres, jovens e crianças, na difícil e necessária tarefa de transformar a existência no dia a dia, os quais com seus posicionamentos e ações cotidianas  nos transformam também como nação e como indivíduos e concretizam esperanças em tempos sombrios.





















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