Moa do Katendê e Marielle Franco: presentes!

Marcelo Guimarães Lima



Fotos: Marcelo Guimarães Lima


O país vive um momento dramático no qual as forças de desagregação social e política, acumuladas na história recente do Brasil a partir da ditadura militar, com a planejada e “desejada” eleição de um personagem sumamente medíocre, um agitador vulgar e irresponsável acobertado por uma mídia complacente, quando não cúmplice direta, por instituições formalmente democráticas acovardadas ou instrumentalizadas pela extrema direita, estas forças funestas de conflito e desagregação ameaçam assenhorar-se do poder do estado e instituir a ferro e fogo uma versão neoliberal da danosa ditadura militar da segunda metade do século passado.

No clima atual de histeria coletiva, de morbidez destrutiva e insanidade insuflada, multiplicam-se os relatos de agressões contra adversários políticos, reais ou imaginários, contra minorias étnicas ou comportamentais, amalgamados aqueles e estas, enquanto desafiadoras da identidade dominante, sob uma única designação caricatural de  “comunismo”, uma espécie de marca “universal” do mal e fonte genérica dos males passados, presentes e futuros da nação.

Na instrumentalização dos conflitos sociais que estruturam a sociedade moderna, no Brasil e no mundo, as conquistas civilizatórias básicas do direito à livre expressão de ideias, de proteção aos direitos individuais e da participação plural, ainda que restrita, nos negócios públicos, são descartadas e desprezadas. Chegamos afinal no país à situação almejada e construída nas ultimas décadas pelos donos do dinheiro e seus associados, pelos os donos da comunicação pública privatizada e seus servidores: a destruição de toda e qualquer oposição ao poder do capital e sua ideologia. Que estes, capitalistas e para-jornalistas, possam sucumbir individualmente às forças destrutivas que insuflaram, é algo que a história do nazi-fascismo no século XX nos ensina, entre várias outras lições que os atuais “mestres” da situação presente ignoram por sua conta e risco. O desejo que se coloca à frente da realidade é invariavelmente fonte de infortúnios tanto para os indivíduos quanto para sociedades.

E, no entanto, apesar das aparências e da tentativa de impor como fato consumado a eleição do inominável aventureiro, a aposta da classe dominante brasileira, na esteira da dominação mundial e sua crise, é arriscada em todos os aspectos. A situação de aguçamento dos conflitos, a demonstração de força “irresistível”, isto é, o terrorismo simbólico como método é, ao mesmo tempo, evidência de uma dominação instável e contestada, ou não se justificaria o vultoso investimento, emocional e financeiro, a aposta no confronto e na “solução final” como necessidade premente.

Ao terrorismo simbólico associa-se invariavelmente, num tal contexto, o terrorismo de fato. Os assassinatos da vereadora Marielle Franco no Rio de Janeiro e do mestre de capoeira Moa do Katendê na Bahia, em seus contextos apenas diferenciados, fazem parte do mesmo processo que aposta no dilaceramento da sociedade brasileira como forma de controle e imposição da agenda de extrema direita para o país.

Na Praça da República em São Paulo no dia 20 de outubro de 2018, grupos e entidades representando a cultura e tradições afro-brasileiras e as comunidades LGBT realizaram manifestação de protesto, de afirmação de direitos e conclamação à resistência, um chamamento à luta contra as forças da barbárie e regressão social que ameaçam o país, uma homenagem aos heróis caídos: Marielle Franco e mestre Moa do Katendê. Heróis de fato, pela coragem e os valores que demonstraram em vida: heróis do cotidiano, da política e da cultura, exemplos de engajamento e comprometimento com os valores, as identidades, os percursos históricos e as aspirações de suas comunidades e como, tal, portadores dos valores universais de liberdade, autonomia e justiça nestes tempos em que à covardia dos assassinos se une a covardia dos que tem como dever profissional a defesa das leis  e do estado de direito no país e o mutismo interessado e partidário dos meios de comunicação privatizados.

No registro fotográfico que realizamos  é visível a força e o significado vital da cultura negra e mestiça no país, na vida cotidiana, nas artes, na consciência sensível do povo brasileiro. A resistência cultural que caracterizou a história da população negra no Brasil, desde seus primórdios, é parte constitutiva, e a melhor parte, do que somos como nação e cultura. É a imagem da nação brasileira que se construiu no passado e se constrói hoje vencendo as adversidades com força e coragem. É o índice da nossa força coletiva contra a violência da extrema direita, contra a omissão e covardia de muitos, contra todos os oportunismos, contra os atuais traidores do povo brasileiro e os vendilhões da nação.































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