O regime golpista e as eleições

Marcelo Guimarães Lima


 




O talentoso e mordaz Jota Camelo faz sua crônica visual, sempre direta, expressiva e certeira, sobre a entrevista e capa da revista Time com o nosso presidenciável, de fato, o presidente de jure do Brasil, reconhecido favorito nas últimas eleições, que o golpe de 2016, Moro e a emporcalhada Lava-Jato, junto com o Partido da Imprensa Golpista (Globo, Folha de SP, Estadão, etc) e tutti quanti, afastaram da disputa pela presidência em 2018, mas não conseguiram eliminar da vida política e destruir seu significado no imaginário popular como visavam, apesar de todas as violências, mentiras, baixezas e iniquidades.

A charge de Jota Camelo explicita o "subtexto" da imagem de Lula na capa da Time no contexto nacional e mundial. A entrevista de Lula cai como raio em céu azul (ou meio nublado) no panorama da direita golpista e da extrema direita brasileira. Na introdução da entrevista pelo jornalista norte-americano, a figura do atual presidente brasileiro de facto, o ex-militar e antigo personagem do baixo clero  parlamentar Jair Bolsonaro, como diz a expressão popular: "não sai bem na fita". A publicação, observaram alguns analistas, é recado do Tio Sam aos militares brasileiros comprometidos com as veleidades golpistas do Capitão do Caos.

Com efeito, Biden e os democratas tentam isolar a extrema direita nos EUA e seu líder Donald Trump num embate crucial para o futuro político da atual administração. Deste modo, a continuidade do neofascismo militarizado, de estilo tropical-trumpista, ocupando a presidência do Brasil, com seus auxiliares nas milícias armadas clandestinas e nas milícias digitais, incluindo os doutrinadores extremistas religiosos,  não seria, ao menos publicamente e no contexto imediato, de interesse do atual governo americano. 

Claro está, que as ações e posições da política externa norte-americana tem aspectos, esferas, camadas diversas cuja articulação e direção, e consequentes metas e processos, podem apresentar graus diversos de complexidade, de contradições aparentes, sob o interesse maior da arregimentação e controle em "última instância" do poder global pelo atual regime imperial da classe dominante norte-americana e seus aliados.

A estabilização de uma situação de "normalidade democrática" no Brasil seria do interesse dos democratas nos EUA, com importantes repercussões também na America Latina. Para tanto a derrota eleitoral de Bolsonaro, antecipada pelas pesquisas, se e quando concretizada, teria ou terá de ser de algum modo absorvida pelo regime golpista sob o qual vive e padece a maioria do povo brasileiro, regime impulsionado e sustentado pelo núcleo duro da burguesia brasileira e seu ultra-neoliberalismo periférico. 

As alianças em torno da candidatura de Lula, são, entre outros vários aspectos, indicativos da  transformação das condições que permitiram o rápido sucesso da frente golpista de 2016 e em 2018, e índice dos desafios atuais para a manutenção do regime. O regime golpista busca uma nova face pública e identidade e não pode eliminar os riscos de um tal processo.

É certo que a "normalidade democrática" na sua acepção mais ampla é hoje, aqui e alhures sob o domínio do neoliberalismo, algo como uma projeção imaginária. No entanto, no nosso contexto, face à reafirmação golpista do projeto reacionário de caráter "infraestrutural" na história moderna do país, não deixa de ter alguns efeitos reais de interesse para o povo e o país. A luta popular desafia a "democracia" exclusionária dos golpistas.   

Que Bolsonaro e seus militares não podem se contentar com um papel delimitado e temporário de poder é certo. Mas é igualmente certo que as dificuldades estão postas para o projeto neo-ditatorial da extrema direita. As revelações recentes de "conselhos" ao Capitão do Caos e seus militares pela CIA, a entrevista de Lula pela revista Time, as disputas internas ao regime golpista que minam o desgoverno atual, tantas indicações de que o custo de um novo golpe militar está cada vez mais elevado para a direita e a extrema direita. O regime golpista após servir-se de Bolsonaro e seus militares ultra-reacionários, deverá ser capaz de mostrar-se com novas roupagens para preservar suas metas e seus ganhos desde a fraudulenta destituição de Dilma Rousseff. 

Comments

postagens + vistas