Hospício a céu aberto

Marcelo Guimarães Lima

Temos na presidência da república bananeira do Brasil, oficialmente chamada república federativa, um senhor nitidamente desequilibrado e evidentemente despreparado para o cargo que ocupa. Isto é mais do que evidente, não é opinião: o que faz, o que deixa de fazer, o que diz, desdiz e não diz o ex- militar e político profissional, Sr. Jair Bolsonaro, comprovam o afirmado, é fato.  E fatos não deixam de ser o que são por passes de mágica retórica, por desejos ardentes, por negativas ou por decretos, etc.

O Sr. Jair Bolsonaro é a aposta antinacional e antipopular da classe dominante brasileira, quer dizer, de banqueiros, financistas, proprietários dos meios de comunicação, grandes empresários e o conjunto de associados, maiores e menores, que gravitam em torno aos centros de poder de fato do país.

O Sr. Jair Bolsonaro ocupa o poder no Brasil porque os donos do poder assim decidiram e continuam permitindo.

O Sr. Jair Bolsonaro, vale a pena repetir, de fato espelha este grupo, é o retrato sem retoques da classe dominante brasileira. Retrato escarrado (vale a expressão!) destes grandes senhores que se julgam acima do bem e do mal, donos da comunicação e consequentemente da verdade, proprietários da república, senhores do país e do povo que os alimenta e que eles desprezam profundamente.

A chamada “elite” partilha com o atual presidente um narcisismo extremado. O capitão é o “melhor” entre os seus pares do baixo-clero parlamentar e da extrema direita mais ou menos organizada e impulsionada pela direita tradicional. Os de cima (a “elite”) se julgam “gente fina”, civilizados entre os “bárbaros”, “massa cheirosa” no dizer da jornalista conservadora, ao mesmo tempo em que exibem uma truculência sem peias e sustentam, direta e indiretamente, a violência em todos os níveis da vida comum e das estruturas de domínio, oficiais e oficiosas, no país.

Mas, se além das deficiências gritantes, o Sr. Jair Bolsonaro possui algum talento, é evidente a sua enorme capacidade de atrair pessoas pouco equilibradas para o seu governo. Como um sol, o presidente “acidental” do Brasil atrai corpos celestes, planetas errantes, cometas, lixo espacial, etc.: sejam políticos profissionais de extrema mediocridade, personagens bizarros, suspeitos de crimes ou réus convictos, falsos intelectuais, ativistas venais de extrema direita, mercadores do sagrado, militares reformados ou não, e recentemente a ex-atriz Regina Duarte.

Constrangedora, deprimente, espetáculo malsão a recente entrevista para a CNN da Sra. Regina Duarte.

Respondeu a perguntas que não queria responder com uma tentativa canhestra de intimidade simulada, de vítima de mal entendido ou exposição indevida, chamando a atenção dos jornalistas e do público que foi ali tratar do assunto “Regina Duarte ministra” e definitivamente não foi responder questionamentos não-oficiosos sobre o tema Brasil, sobre cultura brasileira, sua participação política no governo de extrema direita e outros assuntos semelhantes, todos sem muita importância em comparação.

Regina Duarte, ex-atriz da Globo, deu o ar de sua graça ao país e aceitou ser ministra, quer dizer, fez um grande favor ao público! Como pode então ser questionada assim, sem mais rodeios (sem alertas!) sobre assuntos desagradáveis como a ditadura militar, suas lealdades ideológicas, sua atuação, suas iniciativas ou falta de ação produtiva no ministério para a cultura, as artes e os artistas?

Sorridente e algo surpresa, em desconforto com as questões e na tentativa de controlar o diálogo representando falsa intimidade e “simpatia” calculada, ambos os comportamentos disfuncionais na situação, a Sra. Regina Duarte insultou o Brasil e os brasileiros.

Os torturados e assassinados pela ditadura militar, vários artistas entre eles, os mortos de hoje pelos equívocos, as ações destrutivas em relação à saúde pública, a inação nas urgências do desgoverno do qual ela é parte, são afinal “coisas da vida”, não lhe tiram o sono, é evidente, e na situação da entrevista representaram para a entrevistada um desvio do tema central e realmente importante: Regina Duarte, ela própria.

A ex-atriz Regina Duarte não deve ser questionada e nos comunica a todos. Ao mesmo tempo, revela em tom de galhofa seu desprezo pela dor alheia, seu desprezo pelo diálogo, suas convicções ultrarreacionárias, sua lealdade ideológica com a extrema direita no poder acima de qualquer outra preocupação com, por exemplo, o conjunto da profissão ou mesmo com a cidadania.

A ex-atriz expos publicamente, nas suas respostas e evasivas, profundas limitações cognitivas e graves, digamos assim, lacunas éticas. Espetáculo deprimente.

Episódio menor e passageiro, no meio de tantos descalabros e horrores na atualidade do país, que por si não mereceria mais atenção, mas que é significativo em parte pela repugnância que nos desperta e principalmente para lembrar, a quem ainda precisa ser lembrado, o padrão mental e moral do atual desgoverno, no qual a figura modelo é o próprio Sr. Jair Bolsonaro.

Os semelhantes se atraem mutuamente. Os alucinados hoje parecem encontrar um “lugar natural” no Hospício Brasil.

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